Contemplação de Jesus Menino
Que vamos fazer, nestes dias do tempo de Natal, já desde a
noite em que Jesus nasceu? Voltar os olhos e o coração, inteiramente, para a
figura do Menino, envolto nos paninhos que a Mãe trouxe de Nazaré e reclinado sobre
as palhas do Presépio. Não sentimos desejos de olhar para Ele e dizer-lhe: Meu
Senhor e meu Deus!? Porque esse Menino que vemos na manjedoura é Deus
feito homem, que vem ao nosso encontro para nos salvar. Tanto amou Deus o mundo
– dizia Jesus a Nicodemos – que lhe deu seu Filho único… Deus não enviou o
Filho ao mundo para condená-lo, mas para que o mundo seja salvo por Ele (Jo 3,16).
Contemplando este mistério da Encarnação do Verbo, estamos
no coração da nossa fé cristã. É um mistério que nos dá a certeza de que Deus é
Amor e nos quer com loucura. Essa é precisamente a certeza que fazia o Apóstolo
São João exclamar: Deus é amor! Nisto se manifestou o amor de Deus para
conosco: em nos ter enviado o seu Filho único, para que vivamos por Ele (1 Jo 4,8-9).
Sim, no Natal, o amor de Deus invisível se faz visível. Está
aqui, junto de nós, no Presépio.
São João extasiava-se com essa maravilha da bondade de Deus,
que é a vinda do Verbo encarnado, e dizia: Ninguém jamais viu a Deus. O Filho
único, que está no seio do Pai, foi quem o revelou (Jo 1,18). E, cheio de
júbilo por tê-lo conhecido, por ter convivido com Ele durante três anos e ter
experimentado o seu carinho, exclamava: Nós o vimos com os nossos olhos, nós o
contemplamos, nós o ouvimos, nós o tocamos com as mãos…! (cf. 1 Jo 1,1-3) Por
experiência própria, podia afirmar: Aquele que não ama não conhece a Deus, porque
Deus é Amor (1 Jo 4,8).
Jesus é Deus feito homem, que nos ama com toda a força do
seu Amor divino e humano. É o seu um amor grande e verdadeiro, que tem os dois
sinais claros da autenticidade. Primeiro, é uma doação plena. Amor que não se
dá não é amor. Mas não é um dar-se qualquer, é uma doação que visa o nosso bem.
E aí está o segundo sinal de autenticidade: todo o verdadeiro amor, ao dar-se, quer
bem, ou seja, dá-se procurando o bem da pessoa amada.
A verdade que Jesus nos traz
E qual é o bem, quais são os bens que Jesus nos traz? Todos
os bens! A vida verdadeira, a vida eterna! A felicidade que não poderá morrer! Nessa
infinita riqueza de bens divinos, podemos distinguir especialmente três grandes
tesouros. O tesouro da verdade, que Ele nos ensina; o tesouro do caminho do
Céu, que Ele abre e nos mostra; e o tesouro da vida nova dos filhos de Deus, que
Ele ganha para nós na Cruz.
Tudo isso resumiu-o Jesus numa só frase: Eu sou o Caminho, a
Verdade e a Vida (Jo 14,6). Será que captamos a importância dessas palavras?
Tentemos arrancar do fundo delas a grande luz que encerram, meditando um pouco
sobre o seu significado.
Jesus nos traz, primeiro, a luz da Verdade. Vem-me à cabeça
agora o pai de São João Batista, Zacarias – o marido de Santa Isabel –, que
profetizou o nascimento de Jesus de uma maneira muito significativa. Dizia que a
ternura e misericórdia do nosso Deus nos vai trazer do alto a visita do Sol
nascente, que há de iluminar os que jazem nas trevas e nas sombras da morte e
dirigir os nossos passos no caminho da paz (Lc 1,78-79). Desde antes de nascer,
Jesus já é anunciado como o Sol, como a Luz, a Luz da Verdade, que nos guiará
para o bem e para a paz, para a paz terrena e eterna.
Isso é o que também diz São João no prólogo do seu Evangelho?
Ele era a verdadeira Luz, que vindo ao mundo ilumina todo homem… A luz
resplandece nas trevas, e as trevas não a compreenderam (cf. Jo 1,9-11). Que
pena se nós não a recebêssemos, que pena se nós não a compreendêssemos! Porque
a Verdade que Ele nos traz não é uma verdade qualquer: é a única verdade-verdadeira,
a única verdade que salva: a verdade sobre Deus, sobre o mundo e sobre o homem.
Só ela pode dar sentido à nossa vida.
Utilizando-nos de uma comparação do próprio Cristo, podemos
dizer que a Verdade que Ele nos ensina é como a semente na mão do semeador. Pode
cair nas pedras ou entre espinhos e morrer; ou pode cair numa boa terra e dar
fruto (cf. Mt 13, 4 ss.). Depende de nós.
Se procurássemos acolher essa Verdade com carinho, seria uma
maravilha, seríamos– no empenho por edificar a nosa vida – como o construtor de
que Jesus falava: Aquele que ouve as minhas palavras e as põe em prática é
semelhante a um homem prudente, que edificou a sua casa sobre a rocha (Mt 7,24).
Nem a chuva, nem o vento, nem as tormentas conseguiriam derrubá-la. Porque essa
verdade nos daria – como diz a Bíblia – um amor forte como a morte (Cânt 8,6).
O caminho que Jesus nos mostra
Se continuarmos a olhar para Jesus Menino, veremos que Ele
nos diz também, como já mencionávamos: Eu sou o Caminho. Toda a sua vida é exemplo
e caminho para nós, é como a sinalização luminosa da estrada que conduz a Deus,
o roteiro que devemos seguir para nos realizarmos nesta terra e na eternidade.
É por isso que Jesus diz, muitas vezes: Segue-me!… Compara-nos
às ovelhas que Ele, o Bom Pastor, conduz, entre brumas e perigos, até o pasto
que alimenta e o refúgio seguro. Ele é o Bom Pastor que caminha adiante delas, adiante
de nós, indicando-nos o caminho; mais: sendo, com o seu exemplo, Ele próprio o
caminho …
Acontece que o caminho de Cristo é, essencialmente, o caminho
do Amor. Caminhai no amor – escrevia São Paulo –, segundo o exemplo de Cristo, que
nos amou e por nós se entregou… (Ef 5,2).
O amor que é caminho é o Amor autêntico, com maiúscula, o
Amor que vem de Deus (1 Jo 4,7). Não é fumaça cor de rosa, nem é uma teoria, nem
é só uma paixão que arde e se evapora, é um amor vivo, sincero e realista, que
se manifesta, no dia-a-dia, na prática das virtudes, que são como que o selo de
garantia do amor.
Por isso, aquele que ama esforça-se por ser – com a graça de
Deus – generoso, compreensivo, dedicado, paciente; e também por ser constante, por
ser forte na adversidade, por ser sóbrio e moderado nos prazeres; por ser
caridoso, gentil, prestativo; por ser justo, discreto…; por dar a Deus cada dia
mais amor, e aos irmãos também. Em suma, por levar a sério a prática das
virtudes humanas e cristãs.
Nunca percamos de vista que aquele que ama faz, age, não
fica só pensando e sentindo. É exatamente isso o que nos diz São João, o grande
intérprete do Amor de Cristo: Meus filhinhos, não amemos com palavras nem com a
língua, mas por atos e em verdade (1 Jo 3,18). E é claro que isso se aplica
tanto ao amor a Deus como ao amor ao próximo. Como diz o mesmo São João: Temos
de Deus este mandamento: quem ama a Deus, ame também a seu irmão (1 Jo 4,21).
A vida que Jesus nos dá
Com o olhar da contemplação sempre fixo no Menino, pensemos
na terceira coisa que Ele nos diz: Eu sou a Vida. Jesus é Deus que se faz
homem, para que o homem, de uma maneira inefável, passe a viver uma vida nova, a
vida de “Deus”. É um pensamento que deixava os santos pasmados, inebriados de
alegria e agradecimento. Significa que Jesus nos traz a graça divina, a graça
do Espírito Santo, que nos une intimamente a Ele e nos comunica a sua própria vida:
Da sua plenitude todos nós recebemos, e graça sobre graça. Pois a lei foi dada
por Moisés, a graça e a verdade vieram por Jesus Cristo (Jo 1, 16-17).
Como conforta pensar que a graça divina, que recebemos pela
primeira vez no batismo, nos transforma, comunicando-nos uma vida nova, que é –
nada mais e nada menos – uma participação na própria vida de Deus. O Novo
Testamento traz expressões belíssimas desse mistério da graça na alma. Por
exemplo, São Pedro diz que ela nos faz participantes da natureza divina (2 Pedr
1,4). São João afirma que a graça – que vem sempre à alma juntamente com o
Espírito Santo – nos dá o poder de nos tornarmos filhos de Deus (Jo 1, 12). E
São Paulo declara, com grande alegria, que, com a graça do Espírito Santo, não
recebemos um espírito de escravidão, para vivermos ainda no temor, mas
recebemos o espírito de adoção como filhos, pelo qual clamamos: Abbá, Pai! Papai!
(Rom 8,15).
Jesus, nosso Redentor, é a fonte de toda a graça. Aquele que
tiver sede, venha a mim e beba (Jo 7,37), dizia… E nos prometia derramar o
Espírito Santo, sem medida, na alma.
Na verdade, o peito de Cristo aberto na Cruz, até dar-nos as
últimas gotas de sangue e água, é o manancial de onde brotam as sete fontes
pelas quais nos vem a graça do Espírito Santo: os sete Sacramentos.
Cada um deles nos une a Deus (e aos nossos irmãos) de uma
maneira própria. O Batismo transforma-nos em filhos de Deus; a Crisma dá-nos a
força do Espírito Santo para sermos fiéis soldados de Cristo e apóstolos; a
Reconciliação ou Confissão cura a alma doente e ressuscita a que está morta
pelo pecado; a Eucaristia une-nos intimamente a Jesus, que se faz Alimento e
Vida da nossa alma; o sacramento da Ordem transforma os sacerdotes em
instrumentos vivos de Cristo sacerdote; o Matrimônio implanta a poderosa
semente da graça e do amor de Deus no amor dos esposos e dos pais; e a Unção
dos Enfermos é a mão carinhosa de Jesus, que nos ergue da doença ou nos leva
para o Céu.
E, assim, os sete Sacramentos, juntamente com as virtudes e
com a força poe rosa da oração – que é a respiração vital da alma do cristão – vão-nos
identificando com Cristo, vão-nos transformando espiritualmente nEle, fazem com
que pensemos como Cristo, sintamos como Cristo, amemos como Cristo, atuemos
como Cristo. Esta é a vida dos cristãos, a vida dos filhos de Deus que se
identificam com Jesus.
Por isso, este tempo de Natal é um bom momento para nos
perguntarmos, diante de Jesus Menino: “Eu vivo como filho de Deus? A minha
oração é oração de um filho? Está cheia do abandono e da confiança dos filhos
muito amados? Posso dizer que o meu temor é filial, ou seja, que não temo que
Deus me abandone ou me castigue, mas temo só magoá-lo, ofendê-lo? Cumpro os
mandamentos com carinho de filho, ou com a má vontade do escravo forçado? Tenho
delicadezas de afeto filial para com Deus, para com Nossa Senhora…? Enfim, eu
poderia pôr o adjetivo filial em tudo o que penso, sinto e faço?…”
Seria tão bom que este Natal nos envolvesse no Amor de Deus,
tal como uma grande luz envolveu os pastores, na noite em que Jesus nasceu (Lc 2,9),
e nos tirasse da mediocridade e da tristeza, que é sempre fruto de algum obstáculo
(preguiça, egoísmo, mesquinhez, sensualidade…) entre Deus e mim, como dizia São
Josemaria.
Coloquemos este bom desejo aos pés de Jesus, neste santo
Natal. Não nos esqueçamos de que, em cada Natal, Deus chega muito perto de nós.
Em cada Natal, Jesus – ultrapassando as barreiras do tempo – leva-nos para
junto do Presépio. Em cada Natal, Maria, a Mãe, oferece-nos o Menino, sob o
olhar sorridente de José. Em cada Natal, Jesus também sorri para nós, e nos
pergunta: “Será agora? Será desta vez…? Confia – diz-nos –, eu estou aqui para
te ajudar”. Sim, em cada Natal, uma grande luz brilha para nós. Em cada Natal, há
uma esperança que desponta. Cada Natal, em suma, pode ser para nós um novo nascimento.
É isso que agora deveríamos pedir com muita fé a Jesus, pela intercessão de
Maria, sua Mãe e Mãe nossa, e de São José.
(adaptação de um capítulo do livro de F. Faus: Natal, reunião
dos sorrisos)
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