domingo, 30 de setembro de 2012

FELICIDADE E PRAZER





Quem conhece um mínimo de História, sabe que, durante milênios, tanto os mais elevados espíritos pagãos como os cristãos – no Ocidente e no Oriente – chegaram à certeza de que a autêntica felicidade só podia encontrar-se na virtude, no bem, na realização do ideal divino sobre o homem. Os homens e as mulheres falhavam, pecavam, cometiam crimes, eram muitas vezes mesquinhos; mas em nenhum momento se apregoou ou se pensou que o mal residisse no sofrimento ou no sacrifício; o mal estava, sim, na falta de virtude, na falta de valores, na mentira, no desregramento, na escravidão da alma às paixões baixas, em suma, no mal moral, no pecado.
Todos os heróis admirados e propostos como modelo à juventude eram homens e mulheres capazes de grandes sacrifícios, de generosas renúncias, de heróicos sofrimentos por uma causa, por um ideal que se identificava sempre com a verdade e o bem, e nunca com a auto-satisfação hedonista ou o interesse egoísta. Este era o comum denominador dos grandes personagens bíblicos – Moisés, Davi, Judite, Ester... –, dos heróis pagãos – Aquiles, Penélope, Enéias, Dido... – e dos heróis cristãos, quer se tratasse de mártires, de virgens enamoradas de Deus, de grandes servidores dos pobres; quer de modelos de cavaleiro cristão, como o rei São Luís da França ou El-Rei Dom Sebastião; ou os heróis lendários como Sir Lancelot, Tirant lo Blanc e o louco e genial Dom Quixote de la Mancha. O espelho da grandeza era a virtude. E a virtude não só tolerava, mas exigia o sofrimento heróico, paciente, e o sacrifício desinteressado, até chegar à entrega – sem um arrepio – da própria vida. Agora, essa página de milênios parece estar sendo rasgada em muitos ambientes, para grande satisfação de Satanás. Na chamada modernidade, o pai da mentira – pelos seus mil porta-vozes – pontifica na mídia, na televisão, na Internet, no cinema, nas revistas, nas letras das canções, nas aulas dos colégios, cursinhos e faculdades, nos consultórios psicológicos, psiquiátricos ou astrológicos, e a toda a hora diz, proclama, prega, como quem define um dogma de fé incontrovertível: “Abaixo a cruz, apaguemos a cruz, deletemos o sofrimento, o sacrifício sem gosto, desprezemos o sacrifício sem o prazer da ambição, do poder, da posse, da vaidade corporal, da vaidade profissional, da vaidade esportiva. Sejamos felizes, meus senhores, e convençamo-nos de que a felicidade não está nas balelas do bem nem da virtude – isso já era! –, mas no Prazer, que é o nosso único e verdadeiro bem, o nosso único e verdadeiro deus”. Com estes parâmetros começa infelizmente muitas vezes a formação de muitas crianças, que os pais não se atrevem a contrariar (comem o que querem, assistem aos programas de tv que querem, navegam na Internet como querem, falam grosso a quem querem, vestem como querem, sujam o que querem...); que pais e professores não ousam limitar, disciplinar, por medo de que sofram e fiquem com raiva ou traumatizadas.
Assim crescem muitos adolescentes, sem um mínimo de ordem, de autodomínio, de capacidade de sacrifício e de renúncia, sem condições de fazer algo de que não gostem ou que não sintam, pois, como todos dizem, isso não seria autêntico. Assim se abalançam a um sexo sem amor nem finalidade, desumanizado e bestial, em que o prazer é a única regra, e já não há respeito, nem ideal, nem amor, nem limites para as mais aberrantes e degradantes experiências.
E como a experiência do prazer é ávida e insaciável, nunca se chega ao limite. É preciso tentar também as drogas, mergulhar no álcool, sentir a embriaguez de jogos suicidas: racha, roleta-russa, etc. A vida egoísta, sem a finalidade de um bem, acaba devorando-se a si mesma.
Chega depois a idade adulta, e se manifestam então um homem ou uma mulher que, mesmo quando estão profissionalmente preparados, se revelam incapazes de assumir o sacrifício e de enfrentar a cruz que é necessária para edificar uma família, para ter e educar filhos, para ser fiéis, para ser honestos no trabalho, para compreender e suportar com paciência os defeitos dos colegas... Chegou a idade adulta e, como no conto de fadas, um dedo de criança invisível aponta para eles e diz: O rei está nu! Está nu, está despreparado, carente de virtudes, de amor à verdade e ao bem, de algo que não seja o prazer e a satisfação autista do seu eu.Mas é justamente nesta cultura sem Cruz que se dá, em proporções nunca vistas na História, o máximo índice per capita de tristeza, de solidão, de tédio, de mau humor, de necessidade de fuga, de escravidão aos vícios e paixões, de violência, de desrespeito ao próximo, de vazio.“A gente – diagnosticava mons. Escrivá em São Paulo, em 1974 – está triste. Fazem muito barulho, cantam, dançam, gritam – mas soluçam. No fundo do coração, só têm lágrimas: não são felizes, são desgraçados”
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No mesmo sentido, o Papa João Paulo II referia-se incisivamente a essa situação numa alocução de 18 de junho de 1991: “Não é difícil, mesmo para um observador que fique apenas no nível da psicologia e da experiência, descobrir que a degradação no campo do prazer e do amor é proporcional ao vazio que deixam no homem as alegrias que enganam e defraudam, procuradas naquilo que São Paulo chamava as «obras da carne»: Fornicação, impureza, libertinagem [...], bebedeiras, orgias e coisas semelhantes (Gál 5, 19.21). A estas alegrias falsas podem acrescentar-se, e às vezes vão juntas, as que se procuram na posse e no uso desenfreado da riqueza, no exibicionismo do luxo e na ambição de poder”.

Trecho do livro: A Sabedoria da cruz , Francisco Faus 

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

O quinto mandamento do Decálogo


A vida humana é sagrada, porque é fruto da ação criadora de Deus e permanece sempre em uma especial relação com o Criador.




1. “Não matarás”



«A vida humana é sagrada, porque desde seu início é fruto da ação criadora de Deus e permanece sempre em uma especial relação com o Criador, seu único fim (...); ninguém, em nenhuma circunstância, pode atribuir-se o direito de matar, de modo direto, a um ser humano inocente» (Catecismo, 2258). 

O homem é alguém singular: a única criatura deste mundo à qual Deus ama por si mesma [1]. Está destinado a conhecer e a amar eternamente a Deus, e sua vida é sagrada. Foi criado à imagem e semelhança de Deus (cfr. Gn 1, 26-27), e este é o fundamento último da dignidade humana e do mandamento não matarás. 

O livro do Gênesis apresenta o abuso contra a vida humana como consequência do pecado original. Yahvé manifesta-se sempre como protetor da vida: inclusive da de Caim, após ter matado  seu irmão Abel; sangue de seu sangue, imagem de todo homicídio. Ninguém deve fazer justiça por sua própria mão, e ninguém pode dar-se o direito de dispor da vida do próximo (cfr. Gn 4, 13-15). 

Este mandamento faz referência aos seres humanos. É legítimo servir-se dos animais para obter alimento, vestido, etc.: Deus colocou-os na terra para que estivessem a serviço do homem. A conveniência de não os matar ou maltratá-los provem da desordem que pode implicar nas paixões humanas, ou de um dever de justiça (se são propriedade de outro) (cfr.Catecismo, 2417). Além do mais, não se deve esquecer que o homem não é “dono” da Criação, mas administrador e,  portanto, tem obrigação de respeitar e cuidar da natureza, da qual precisa para sua própria existência e desenvolvimento (cfr. Catecismo, 2418). 

2. Plenitude deste mandamento 

O mandamento de salvaguardar a vida do homem «tem seu aspecto mais profundo na exigência da veneração e amor para com  a pessoa e sua vida»[2]. 

A misericórdia e o perdão são próprios de Deus; e na vida dos filhos de Deus também deve estar presente a misericórdia, que nos leva a compadecermo-nos, em nosso coração, pela miséria alheia: «Bem-aventurados os misericordiosos porque eles alcançarão a misericórdia» (Mt 5, 7)[3]. 

É necessário também  aprender a perdoar as ofensas (cfr. Mt 5, 22). Ao receber uma ofensa deve- se tentar não se encolerizar, nem permitir que a ira invada o coração.  Mais ainda, no Pai-Nosso – a oração que nos deixou Jesus como oração dominical–, o Senhor une seu perdão –o perdão a respeito das ofensas que cometemos– ao perdão dos que nos ofenderam (cfr. Mt 6, 9-13; Lc 11, 2-4). Nesta luta nos ajudará: contemplar a Paixão de Nosso Senhor, que nos perdoou e redimiu levando com amor e com paciência as injustiças; considerar que ninguém deve parecer,  para o cristão, um estranho ou um inimigo (cfr. Mt 5, 44-45); pensar no julgamento que segue à morte, no qual seremos julgados sobre amor ao próximo; recordar que um cristão deve vencer o mal com o bem (cfr. Rm 12, 21); e ver as injurias como oportunidade para a própria purificação. 

3. O respeito da vida humana 

O quinto preceito manda não matar. Condena também bater, ferir ou fazer qualquer dano injusto a si mesmo e ao próximo no corpo, quer por si, quer por outros; bem como ofender com palavras injuriosas ou querer o  mal. Neste mandamento  é proibido igualmente matar-se (suicídio). 

3.1. O homicídio voluntário 

«O quinto mandamento condena como gravemente pecaminoso o homicídio direto e voluntário. Aquele que mata e aqueles que cooperam voluntariamente com ele cometem um pecado que clama vingança ao céu (cfr. Gn 4, 19)» (Catecismo, 2268)[4]. 

A encíclica Evangelium vitae formulou de modo definitivo e infalível a seguinte norma negativa: «com a autoridade conferida por Cristo a Pedro e a seus Sucessores, em comunhão com os Bispos da Igreja católica, confirmo que a eliminação direta e voluntária de um ser humano inocente é sempre gravemente imoral. Esta doutrina, fundamentada naquela lei não escrita que  cada homem, à luz da razão, encontra no próprio coração (cfr.Rm 2, 14-15), é corroborada pela Sagrada Escritura, transmitida pela Tradição da Igreja e ensinada pelo Magistério ordinário e universal»[5]. Assim, o homicídio que é, sem exceção, gravemente imoral é aquele que responde a uma escolha deliberada e se dirige a uma pessoa inocente. Portanto, a legítima defesa e a pena de morte não se incluem nesta formulação absoluta, e são objeto de um tratamento específico [6]. 

Colocar a vida nas mãos do homem implica num poder de disposição, que pressupõe saber administrá-lo como uma colaboração com Deus. Isto exige uma atitude de amor e de serviço, e não de domínio arbitrário: trata-se de um senhorio ministerial, não absoluto, reflexo do senhorio único e infinito de Deus [7]. 

3.2. O aborto 

«A vida humana deve ser respeitada e protegida de maneira absolutadesde o momento da concepção» (Catecismo, 2270). Não é admissível nenhuma discriminação, nem sequer a baseada nas diferentes etapas do desenvolvimento da vida. Em situações  conflituosas, é determinante a  filiação natural à espécie biológica humana. Com isto não se impõem à pesquisa biomédica limites diferentes daqueles que a dignidade humana estabelece para qualquer outro campo da atividade humana. 

«O aborto direto, isto é, desejado como fim ou como meio, é sempre uma desordem moral grave  enquanto eliminação deliberada de um ser humano inocente» [8]. A expressão como fim ou como meio compreende as duas modalidades da voluntariedade direta: neste caso, o que atua quer conscientemente matar, e por isso cumpre a ação. 

«Nenhuma circunstância, nenhuma finalidade, nenhuma lei do mundo poderá jamais tornar lícito um ato que é intrinsecamente ilícito, por ser contrário à Lei de Deus, escrita no coração da cada homem, reconhecível pela mesma razão e proclamada pela Igreja» [9]. O respeito da vida deve ser reconhecido como o confím que nenhuma atividade individual ou estatal pode superar. O direito inalienável de toda pessoa humana inocente à vida é um elemento constitutivo da sociedade civil e de sualegislação e como tal deve ser reconhecido e respeitado tanto por parte da sociedade como da autoridade política (cfr. Catecismo, 2273)[10]. 

Assim, podemos afirmar que «o direito de mandar constitui uma exigência da ordem espiritual [moral] e provem de Deus. Por isso, se os governantes promulgam uma lei ou ditam uma disposição qualquer contrária a essa ordem espiritual e, portanto, oposta à vontade de Deus, em tal caso nem a lei promulgada nem a disposição ditada podem obrigar em sã consciência o cidadão (...);  ainda mais, em semelhante situação, a própria autoridade se desmorona por completo e se origina uma iniquidade horrível» [11]. Tanto é assim que «leis deste tipo não só não criam nenhuma obrigação de consciência, mas que, pelo contrário, estabelecem uma grave e precisa obrigação de se opor a elas mediante a objeção de consciência»[12]. 

«Já que deve ser tratado como uma pessoa desde a concepção, o embrião deverá ser defendido em sua integridade, cuidado e atendido medicamente na medida do possível, como todo outro ser humano» (Catecismo, 2274). 

3.3. A eutanásia 

«Por eutanásia ,em sentido verdadeiro e próprio, deve-se entender uma ação ou uma omissão, que por sua natureza e na intenção, causa a morte, com o fim de eliminar qualquer dor (...). É uma grave violação da lei de Deus,  como eliminação deliberada e moralmente inaceitável de uma pessoa humana (...). Semelhante prática implica, segundo as circunstâncias,  a malícia própria do suicídio ou do homicídio»[13]. Trata-se de uma das consequências, gravemente contrárias à dignidade da pessoa humana,  às quais pode levar o hedonismo e a perda do sentido cristão da dor. 

«A interrupção de tratamentos médicos onerosos, perigosos, extraordinários ou desproporcionados aos resultados pode ser legítima. Interromper estes tratamentos é recusar a obstinação terapêutica. Com isto não se pretende provocar a morte; aceita-se não poder  impedi-la» (Catecismo, 2278)[14]. 

Por outro lado, «ainda que a morte for considerada iminente, os cuidados ordinários devidos a uma pessoa não podem ser legitimamente interrompidos» (Catecismo, 2279)[15]. A alimentação e hidratação artificiais são, em princípio, cuidados ordinários devidos a todo doente [16]. 

3.4. O suicídio 

«Somos administradores e não proprietários da vida que Deus nos confiou. Não dispomos dela» (Catecismo, 2280). «O suicídio contradiz a inclinação natural do ser humano em conservar e perpetuar sua vida. É gravemente contrário ao justo amor de si mesmo. Ofende também ao amor do próximo porque rompe injustamente os laços de solidariedade com as sociedades familiar, nacional e humana com as quais temos nossas obrigações. O suicídio é contrário ao amor do Deus vivo» (Catecismo, 2281)[17]. 

Preferir a própria morte para salvar a vida de outro não é suicídio, pelo contrário, pode constituir um ato de extrema caridade. 

3.5. A legítima defesa 

A proibição de causar a morte não suprime o direito de impedir que um injusto agressor cause dano [18]. A legítima defesa pode ser inclusive um dever grave para quem é responsável pela vida do outro ou do bem comum (cfr. Catecismo, 2265). 

3.6. A pena de morte 

Defender o bem comum da sociedade exige que se ponha o agressor em situação de não poder causar dano. Por isto, a legítima autoridade pode infligir penas proporcionais à gravidade dos delitos. As penas têm como fim compensar a desordem introduzida pela falta, preservar a ordem pública e a segurança das pessoas, e a emenda do culpado (cfr.Catecismo, 2266). «Para conseguir estas finalidades a medida e aqualidade da pena devem ser valorizadas e decididas atentamente, sem que se deva chegar à eliminação do réu salvo em casos de absoluta necessidade, isto é, quando a defesa da sociedade não seja possível de outro modo (...). Estes casos são já muito raros, por não dizer praticamente inexistentes» [19]. 

4. O respeito da dignidade das pessoas 

4.1. O respeito à alma do próximo: o escândalo 

Nós, os cristãos, estamos obrigados a buscar a vida e a saúde sobrenatural da alma do próximo, além da do corpo. 

O escândalo é o contrário: «é a atitude ou o comportamento que induz o outro a fazer o mau. O que escandaliza se converte em tentador de seu próximo (...). O escândalo constitui uma falta grave, se por ação ou omissão arrasta deliberadamente o outro a uma falta grave»  (Catecismo, 2284). Pode-se causar escândalo por comentários injustos, pela promoção de espetáculos, livros e revistas imorais, por seguir modas contrárias ao pudor, etc. 

«O escândalo adquire uma gravidade particular segundo a autoridade de quem o  causa ou a debilidade de quem o padece»  (Catecismo, 2285): «àquele que escandalize a um destes pequenos que crêem em mim, mais vale que lhe pendurem ao pescoço uma pedra de moinho e o joguem ao mar» (Mt 18, 6)[20]. 

4.2. O respeito à saúde do corpo 

O respeito ao próprio corpo é uma exigência da caridade, pois o corpo é templo do Espírito Santo (cfr. 1 Co 6, 19; 3, 16ss.; 2 Co 6, 16), e somos responsáveis –naquilo que de nós depende– de buscar a saúde corporal, que é um meio para servir a Deus e aos homens. Mas a vida corporal não é um valor absoluto: a moral cristã opõe-se a uma concepção neopagã que promove o culto ao corpo, e que pode conduzir à perversão das relações humanas (cfr. Catecismo, 2289). 

«A virtude da temperança leva a evitar todo tipo de excessos, o abuso da comida, do álcool, do fumo e dos remédios. Quem em estado de embriaguez, ou por gosto imoderado de velocidade, põe em perigo a segurança dos demais e a sua própria nas estradas, no mar ou no ar, faz-se gravemente culpado» (Catecismo, 2290). 

O uso de drogas é uma falta grave, pelo dano que representa para a saúde, e pela fuga da responsabilidade dos atos que se podem realizar sob sua influência. A produção clandestina e o tráfico de drogas são práticas imorais (cfr. Catecismo, 2291). 

A pesquisa científica não pode legitimar atos que, em si mesmos,  são contrários à dignidade das pessoas e à lei moral. Nenhum ser humano pode ser tratado como um meio para o progresso da ciência (cfr.Catecismo, 2295). Atentam contra este princípio práticas como a procriação artificial substitutiva ou o uso de embriões com fins experimentais. 

4.3. O transplante de órgãos 

A doação de órgãos para transplantes é legítima e pode ser um ato de caridade, se a doação é plenamente livre e gratuita [21], e respeita a ordem da justiça e da caridade. 

«Uma pessoa só pode doar algo do que pode se privar sem sério perigo ou dano para sua própria vida ou identidade pessoal, e por uma razão justa e proporcionada. Resulta óbvio que os órgãos vitais só podem ser doados após a morte»[22]. 

É preciso que o doador ou seus representantes tenham dado seu consentimento consciente (cfr. Catecismo, 2296). Esta doação, «ainda que seja lícita em si mesma, pode chegar a ser ilícita, se viola os direitos e sentimentos de terceiros a quem compete a tutela do cadáver: os parentes próximos, em primeiro termo; mas poderia inclusive tratar de outras pessoas em virtude de direitos públicos ou privados»[23]. 

4.4. O respeito à liberdade física e à integridade corporal 

Os sequestros e o fazer reféns são moralmente ilícitos: é tratar as pessoas só como meios para se obter diversos fins, privando-as injustamente da liberdade. São também gravemente contrários à justiça e à caridade, o terrorismo e a tortura. 

«Excetuados os casos de prescrições médicas de ordem estritamente terapêutico, as amputações, mutilações ou esterilizações diretamente voluntárias de pessoas inocentes são contrárias à lei moral» (Catecismo, 2297). Por outro lado, não são contrárias à lei moral aquelas que se seguem de uma ação terapêutica necessária para o bem do corpo tomado em sua totalidade, e que não se querem nem como fim nem como meio, mas que se sofrem e se toleram. 

4.5. O respeito aos mortos 

«Os corpos dos defuntos devem ser tratados com respeito e caridade na fé e a esperança da ressurreição. Enterrar os mortos é uma obra de misericórdia corporal (cfr. Tb 1, 16-18), que honra os filhos de Deus, templos do Espírito Santo» (Catecismo, 2300). «A Igreja aconselha vivamente que se conserve o piedoso costume de sepultar o cadáver dos defuntos; no entanto não proíbe a cremação, a não ser que tenha sido escolhida por razões contrárias à doutrina cristã» (CIC, can. 1176). 

5. A defesa da paz 

«Bem-aventurados os pacíficos porque eles serão chamados filhos de Deus» (Mt 5, 8). Característica do espírito de filiação divina é ser semeadores de paz e de alegria [24]. «A paz não pode ser atingida na terra, sem a salvaguarda dos bens das pessoas, a livre comunicação entre os seres humanos, o respeito da dignidade das pessoas e dos povos, a prática assídua da fraternidade (...). É obra da justiça (cfr. Is 32, 17) e efeito da caridade» (Catecismo, 2304). 

«Por causa dos males e das injustiças que ocasionam toda guerra, a Igreja roga constantemente a todos a orar e atuar para que a Bondade divina nos livre da antiga servidão da guerra (cfr. Concílio Vaticano II, Const.Gaudium et spes, 81,4)» (Catecismo, 2307). 

Existe uma «legítima defesa mediante a força militar». Mas «a gravidade de semelhante decisão submete a esta a condições rigorosas de legitimidade moral» (Catecismo, 2309)[25]. 

«As injustiças, as desigualdades excessivas de ordem econômica ou social, a inveja, a desconfiança e o orgulho, que existem entre os homens e as nações, ameaçam sem cessar a paz e causam as guerras. Tudo o que se faz para superar estas desordens contribui para edificar a paz e evitar a guerra» (Catecismo, 2317). 

«Ama a tua pátria: o patriotismo é uma virtude cristã. Mas se o patriotismo converte-se em um nacionalismo que leva a olhar com desapego, com desprezo - sem caridade cristã nem justiça - a outros povos, a outras nações, é um pecado» [26]. 

Pau Agulles Simó 


Bibliografía básica 

Catecismo da Igreja Católica, 2258-2330. 

João Paulo II, Enc. Evangelium vitae, 25-3-95, cap. III. 

Leituras recomendadas 

L. Ciccone, La vita umana, Ares, Milano 2000. 

L. Melina, Corso di Bioetica. Il Vangelo della Vita, Piemme, Casale Monferrato 1996. 

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[1] Cfr. Concílio Vaticano II, Const. Gaudium et spes, 24. 

[2] João Paulo II, Enc. Evangelium vitae, 25-3-95, 41. 

[3] «As obras de misericórdia são ações caritativas mediante as quais ajudamos  nosso próximo em suas necessidades corporais e espirituais» (Catecismo, 2447). 

[4] Também «proíbe fazer algo com intenção de provocar indiretamente a morte de uma pessoa. A lei moral proíbe expor  alguém sem razão grave a um risco mortal, bem como negar a assistência a uma pessoa em perigo» (Catecismo, 2269). 

[5] João Paulo II, Enc. Evangelium vitae, 57. 

[6] Cfr. Ibidem, 55-56. 

[7] Cfr. Ibidem, 52. 

[8] Ibidem, 62. 

[9] Ibidem, 62. É tal a gravidade do crime do aborto, que a Igreja sanciona este delito com pena canônica de excomunhão  latae sententiae (cfr.Catecismo, 2272). 

[10] «Estes direitos do homem não estão subordinados nem aos indivíduos nem aos pais, e também não são uma concessão da sociedade ou do Estado: pertencem à natureza humana e são inerentes à pessoa em virtude do ato criador que a originou (...). Quando uma lei positiva priva a uma categoria de seres humanos da proteção que a ordem civil lhes deve, o Estado nega a aldade de todos diante da lei. Quando o Estado não põe seu poder a serviço dos direitos de todo cidadão, e particularmente de quem é mais débil, enfraquecem-se  os próprios  fundamentos do estado de direito” (Congregación para a Doutrina da Fé, Instr. Donum vitae, 22-II-87, 3). 

«Quantos crimes  são cometidos em nome da justiça! Se tu vendesses armas de fogo e alguém te desse o preço de uma delas, para matar com essa arma a tua mãe,  tu a venderias?... Pois, talvez não te dava seu justo preço?... 

Catedrático, jornalista, político, homem de diplomacia: meditem» (São Josemaria, Caminho, 400). 

[11] João XXIII, Enc. Pacem in terris, 11-IV-63, 51. 

[12] João Paulo II, Enc. Evangelium vitae, 73. 

[13] João Paulo II, Enc. Evangelium vitae, 65. 

[14] «As decisões devem ser tomadas pelo paciente, se para isso tem  competência ou capacidade, ou se não pelos que têm os direitos legais, respeitando sempre a vontade razoável e os interesses legítimos do paciente» (Catecismo, 2278). 

[15] «O uso de analgésicos para aliviar os sofrimentos do moribundo, inclusive com risco de abreviar em seus dias, pode ser moralmente conforme à dignidade humana se a morte não é pretendida, nem como fim nem como meio, senão somente prevista e tolerada como inevitável. Os cuidados paliativos constituem uma forma privilegiada da caridade desinteressada.  Por esta razão devem ser encorajados» (Catecismo, 2279). 

[16] Cfr. João Paulo II, Discorso ai partecipanti ao Congresso Internazionale seu “I trattamenti dei sostegno vitale e o stato vegetativo. Progressi scientifici e dilemmi etici”, 20-III-2004, n. 4; cfr. também Conselho Pontifício da Pastoral para os Agentes Sanitários, Carta dos Agentes da Saúde, n. 120; Congregação para a Doutrina da Fé,  Respostas a algumas perguntas da Conferência Episcopal Estadunidense sobre a alimentação e hidratação artificiais, 1-VIII-2007. 

[17] No entanto, «não se deve desesperar pela salvação eterna daquelas pessoas que se deram a morte. Deus pode ter-lhes facilitado caminhos que só Ele  conhece a ocasião de um arrependimento salvador. A Igreja ora pelas pessoas que atentaram contra sua vida» (Catecismo, 2283). 

[18] «O amor a si mesmo constitui um princípio fundamental da moralidade. É, por tanto, legítimo fazer respeitar o próprio direito à vida. Aquele  que defende sua vida não é culpado de homicídio, inclusive quando se vê obrigado a acertar a seu agressor com  um golpe mortal» (Catecismo, 2264; cfr. João Paulo II, Enc. Evangelium vitae, 55): neste caso, o homicídio do agressor não constitui objeto direto da vontade  daquele que se defende, senão que o objeto moral consiste em remover uma iminente ameaça contra a própria vida. 

[19] João Paulo II, Enc. Evangelium vitae, 56. Cfr. Catecismo, 2267. 

[20] «Fazem-se culpados de escândalo aqueles que instituem leis ou estruturas sociais que levam à degradação dos costumes e à corrupção da vida religiosa, ou a “condições sociais que, voluntária ou involuntariamente,  tornam árdua e praticamente impossível uma conduta cristã conforme os mandamentos” (Pio XII, Discurso 1 junho 1941)» (Catecismo, 2286). 

[21] Cfr. João Paulo II, Discurso, 22-6-1991, 3; Catecismo, 2301. 

[22] Ibidem, 4. 

[23] Pio XII, Discorso all’Associazione Italiana Donatori dei Cornea, 14-5-1956. 

[24] Cfr. San Josemaria,  É Cristo que passa, 124. 

[25] «É preciso ao mesmo tempo: 

– Que o dano causado pelo agressor à nação ou à comunidade das nações seja duradouro, grave e verdadeiro. 

– Que todos os demais meios para pôr fim à agressão tenham resultado  impraticáveis ou ineficazes. 

– Que se reúnam as condições sérias de sucesso. 

– Que o emprego das armas não entranhe males e desordens mais graves que o mal que se pretende eliminar. O poder dos meios modernos de destruição obriga a uma prudência extrema na apreciação desta condição. 

Estes são os elementos tradicionais enumerados na doutrina chamada da “guerra justa”. 

A apreciação  destas condições de legitimidade moral pertence ao julgamento prudente daqueles que estão encarregados do bem comum» (Catecismo, 2309). Ademais, «existe a obrigação moral de desobedecer àquelas decisões que ordenam genocídios» (Catecismo, 2313). 

A corrida de armamentos, «em lugar de eliminar as causas de guerra, corre o risco de agravá-las. O investimento de riquezas fabulosas na fabricação de armas sempre mais modernas impede a ajuda aos povos indigentes, e obstaculiza seu desenvolvimento»  (Catecismo, 2315). A  corrida de armamentos «é uma praga gravíssima da humanidade e prejudica aos pobres de modo intolerável» (Concílio Vaticano II, Const.Gaudium et spes, 81). As autoridades têm o direito e o dever de regulamentar  a produção e o comércio de armas (cfr. Catecismo, 2316). 

[26] São Josemaria,  Sulco, 315. Cfr. São Josemaria,  Forja, 879; Caminho, 525.

terça-feira, 18 de setembro de 2012

Santo Agostinho e a fonte de todas as fraquezas


O orgulho é a fonte de todas as fraquezas, por que é a fonte de todos os vícios. Santo Agostinho 


O orgulho e a vaidade foram os responsáveis pela queda humana. Foram eles que nos atiraram neste Vale de Lágrimas gerando a necessidade de sobrevivermos com o “suor de nosso rosto”. “E sereis como Deuses” disse a serpente. Foi a vaidade e o orgulho latentes na natureza humana que acreditaram nesta falsa informação da serpente. Se a queda se deu pela vaidade e o orgulho, a redenção só será possível pela humildade. Foi exatamente isto que Cristo nos ensinou com seu nascimento, vida e morte. Nasceu como o mais humilde dos homens: numa manjedoura em uma estribaria. Viveu como o mais humilde dos homens “não tendo nem onde encostar a cabeça”. Morreu nu, crucificado, flagelado  e sofrendo o escárnio e a humilhação da população. Onde se encontra então a raiz de todo o vício humano de ontem e de hoje? Santo Agostinho tem ou não razão? Deixo com você a resposta.

sábado, 15 de setembro de 2012

O que é ser casto? Por que ser casto? Como ser casto hoje?



Ser casto é muito mais do que ser virgem. No entanto, a pureza, ou castidade, inclui necessariamente a vivência da virgindade. Ser casto abrange toda a pureza de coração, de intenções e de desejo sincero de fazer a vontade de Deus. Inclui a determinação de não pecar (e isso não somente com relação ao sexo, mas em todas as áreas da vida). Inclui, ainda, uma compreensão madura do que seja a vida e a decisão de viver para cumprir a vontade de Deus.
Viver a pureza é uma grande graça, da qual hoje todos zombam abertamente. É correr o grande risco de ser incompreendido, chacoteado, caluniado, humilhado, maltratado. No entanto, vale a pena buscar esta graça. Vale a pena pedi-Ia a Deus e colaborar com toda a nossa vontade para que ela seja efetiva na nossa vida.
No meio do "Anti-tabu" do sexo, agressiva e desafiadoramente praticado nos dias de hoje como algo muito natural, a busca da vida pura é um desafio para jovens de têmpera. Os tolos e imaturos nem sequer o entendem. Aqueles, porém, que encaram a vida com a serena alegria dos que crêem em Deus abraçam o desafio com grande confiança de que a graça irá socorrê-los.
Falar de maneira genérica sobre a castidade nos levaria a todo um tratado sobre a vida santa, o que é muito além de nossas possibilidades e das desta revista. Como sabemos que o que mais questiona o jovem é a razão para a castidade com relação à vivência da sexualidade, é sobre ela que falaremos.
Baseando-se no texto de D. Rafael Cifuentes, vê-se que ele ressalta três pontos essenciais:

A pureza de vida é um mandamento evangélico.

Parece óbvio demais? Engano! Há educadores (desculpe, "educadores") que não mais entendem ou ensinam o sexto mandamento da lei de Deus. O "Não pecar contra a castidade" não faz parte de suas pregações ou é covardemente omitido. Conheço dezenas de casos de ensinos, pregações, aulas, debates, mesas redondas, onde o representante do pensamento cristão, de quem todos esperam respostas esclarecedoras e firmes, se perde em observações esquivas, omissões e relativismos. Com certeza, infelizmente, você conhece outras dezenas.
No entanto, a Palavra e a Doutrina continuam como antes. Não mudaram. Não mudou tampouco (ao contrário do que muitos meios de comunicação divulgaram) a visão da Igreja sobre o sexo pré-marital, a masturbação, o homossexualismo, o adultério, a fornicação, a luxúria. No Catecismo da Igreja Católica em língua francesa (sua língua original) estes conceitos continuam imutáveis. Pensando bem, quem se atreveria a mudar um mandamento da lei de Deus e, ao mesmo tempo, um mandamento evangélico ensidado por Jesus que diz: "bem-aventurados os puros porque verão a Deus?" (Mt 5,8).
Enganam-se os que pensam poder-se relativizar o que está bem claro tanto no Novo quanto no Antigo Testamento, tanto na Doutrina quanto na Tradição e Magistério da Igreja. O problema é que hoje tem gente que nem a isso dá importância.
Enganam-se, também, os que pensam que o casamento seria uma "'quebra" da castidade ou uma "concessão" feita quanto a este mandamento. Muito pelo contrário: a noção correta de castidade envolve o mandamento evangélico da pureza que deve, obrigatoriamente, estar presente tanto no matrimônio quanto no sacerdócio ou no celibato. O conceito evangélico de pureza ultrapassa o de estado de vida.
O segundo ponto ressalta que "o mandamento é muitas vezes recalcado devido à mentalidade de hoje".
De fato. Tem-se medo de pensar diferente, de ser diferente da imensa maioria das pessoas, sejam jovens ou adultos. Tem-se medo de testemunhar o que pensa Deus a este respeito, o que a Igreja ensina, o que todo nós, no fundo no fundo, temos desejo de viver, pois Deus nos criou para sermos santos. O medo e a covardia, sem falar na ingratidão, nos levam a calar, a sermos omissos, a preferirmos a mentalidade do mundo à vontade de Deus. Desta forma, "recalcamos" o mandamento evangélico da pureza, isto é, abafamo-lo, ignoramo-lo, tratamos de relativizá-lo para sermos mais "normais", mais bem aceitos. Corremos até o risco de achar que se fizermos isso vamos ter mais facilidade de nos aproximar dos jovens e levá-los a Jesus. Terrível engano! Como se pode levar alguém a Jesus deixando-o em seu pecado? O método de Jesus era bem diferente. Ele se aproximava amorosamente do pecador, mas não admitia seu pecado. Claro, não condenou jamais o pecador e, no entanto, nunca deixou de condenar o pecado abertamente e a ordenar com clareza: "Vai e não peque mais" . Quanto mais a gente conhece a beleza de alma que Deus deu ao jovem, mais a gente se convence que o que ele quer é Jesus. Jesus como Ele é: verdadeiro; radical quanto à perfeição de vida, mas extremamente misericordioso para com o pecador; absolutamente radical quando se trata de redimir ou retratar o pecado (veja-se Zaqueu), mas extremamente flexível quanto à regeneração do homem aviltado por seus pecados. Jovem quer Jesus. Um Jesus corajoso, radical, misericordioso, livre, como o jovem deseja ser.
O terceiro ponto é contundente: este recalque do mandamento, seja por medo e covardia, seja na ilusão do ser aceito para "evangelizar", "produz distúrbios espirituais e psíquicos".
Nada mais previsível. Se Deus criou o homem pua o amor a Ele, a seus irmãos e a si mesmo, tudo o que venha deturpar esta finalidade última de amor e santificação deforma o homem. A isto se dá o nome de pecado.
O recalque do princípio evangélico da pureza visto aqui principalmente como o princípio de castidade, traz enormes prejuízo espirituais, especialmente devido à intemperança e ao vício. E, veja, aqui não estamos falando somente de coisas "'fortes" como relações sexuais antes do matrimônio ou masturbação e homossexualismo masculino ou feminino. Estamos falando de toda uma caminhada de relacionamento também no namoro e no noivado, caso a vocação do jovem seja a do matrimônio. Estamos falando também dos pensamentos, das fantasias, dos filmes e revistas, dos programas de televisão (mesmo aqueles que parecem meros programas de variedades, mas contêm centenas de sentidos duplos em cada palavra dos apresentadores) das conversas; da maneira de vestir; do comportamento sensual ao andar, falar, sentar; das diversões;, da busca desenfreada de mais prazer, de mais emoções, de mais "coisas novas".
Tudo o que, no campo da sexualidade, for uma manipulação do meu irmão para o meu próprio prazer é contrário à castidade, seja fora, seja dentro do matrimônio, fora ou dentro do namoro, na amizade ou no relacionamento superficial. O que for uma manipulação do outro ou de mim mesmo (pois só sou manipulado, usado, se o permitir, exceto no caso do estupro) vai, obviamente, ser ultraje para a minha alma e para o meu psiquismo. Mais que isso, vai produzir distúrbios espirituais como o vício, a incontinência, a falta de auto-domínio, o afastamento de Deus e da Igreja, o afastamento da oração e da Eucaristia, o esfriamento da alma, a falta de temor a Deus, a relativização dos valores evangélicos, só para citar alguns.
No campo dos distúrbios psíquicos teremos a insegurança, a dependência emocional do outro, a dependência emocional de sensações, a culpa, o medo, o sentimento de ser sujo, de não servir mais para nada, entre muitos outros prejuízos, por vezes, irreversíveis.

Mas qual a vantagem de um jovem viver a castidade? Por que ser casto?

Perguntar isso de maneira genérica equivaleria a perguntar qual a vantagem de ser santo. No entanto, se a pergunta se refere especificamente à castidade quanto à sexualidade, dentre as inúmeras vantagens pode-se destacar duas: a fomentação do amor e a liberdade para discernir a própria vocação. É ainda D. Rafael Cifuentes quem nos ensina:
"O coração humano está destinado a amar. Só no amor ele encontra o seu alimento. Quando não se lhe dá amor, ele procura, esfomeado, o primeiro que encontra: a excitação sexual, a descarga hormonal que o levam a uma insatisfação afetiva e a uma frustração amorosa. O coração humano necessita de um amor à altura da sua dignidade. "
Bastaria esta última frase, não é verdade? O seu coração não necessita de um amor degradante, passional, quase animalesco. O seu coração humano necessita de um amor à altura de sua dignidade de filho de Deus. Este amor verdadeiro é o alimento do seu coração e é o único que o leva a Deus. A vivência de uma sexualidade deturpada, pelo contrário, afastam-no de Deus e deixam o seu coração cada vez mais inquieto e faminto em busca de ilusões que o farão cada vez mais fraco e escravizado. Tem razão a Palavra de Deus quando diz, em Jeremias: "Meu povo me abandonou a mim, fonte de água viva, para cavar para si cisternas, cisternas fendidas, que não retêm a água (Jer 2,13)
O seu coração pode descobrir, na vivência tranqüila e corajosa da castidade - seja você homem ou mulher o amor que corresponda ao preceito de "amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo". Desta maneira, você está colocando todo o seu ser, seu espírito, suas forças, na vivência do amor autêntico e, nesta vivência, com toda a certeza, vai ter um ambiente mais propício para descobrir a sua vocação. E, entenda, seja ela celibato, sacerdócio ou matrimônio, seu coração estará muito melhor preparado para descobri-la se estiver livre por amor e para o amor, ainda que namorando, ainda que com inúmeros amigos, ainda que vivendo como o mais normal dos jovens cristãos.
Sendo casto, você fomenta o amor real em você, você se prepara para assumir a vontade de Deus em sua vida. Estas duas coisas são suficientes para garantir a "inteireza"' e a felicidade permanente, serena e madura de qualquer um. Feliz aquele que não se deixar iludir pelos inúmeros prazeres e ofertas do mundo e aceitar o desafio de trilhar a estrada do amor para um amor maior.

Como viver a castidade hoje

Encontro somente uma resposta: como Maria, tendo coragem e fazendo uma opção radical de vida por Jesus e inteiramente apoiada na graça.
A coragem de optar radicalmente por Jesus, como Maria. Na fé. A coragem sustentada pela convicção de que Jesus é a resposta e de que a Igreja fala por Ele, ainda que o mundo pense o contrário, ainda que meus colegas não me aceitem, ainda que o mundo inteiro espere outra coisa de mim.
A coragem de apoiar-se inteiramente na graça de Deus e de abandonar-se com toda a confiança em Deus, sabendo que, ainda que você sofra, d'Ele vem a recompensa, pois Ele é um Deus fiel e sustentará você constantemente.
Viver a castidade hoje exige coragem e determinação. Exige convicção para vestir-se, comportar-se e pensar diferente de todo o mundo. Exige a determinação de ser fiel à vontade de Deus.
Isto, porém, não depende somente de você. A fonte desta coragem e determinação é a graça de Deus. Somente um encontro pessoal com Jesus ressuscitado vai dar a você a coragem e determinação que você não encontra em si mesmo. Somente uma graça especial deste mesmo Jesus levará você a fazer d'Ele o Senhor de sua vida, entregando-se sem medidas e cumprindo a vontade de Deus não por voluntarismo e muito menos por moralismo, mas por amor. Amor a quem amou você primeiro, amor a quem o sustenta e conduz, amor Àquele que transformou sua vida. Um jovem que conhece e ama Jesus assim vive a castidade e as outras virtudes apoiado na graça e encontra n'Ele a coragem de ser luz na escuridão. Aquele que não encontrou Jesus, porém, vai achar tudo muito bonito e vai fazer uma força enorme para viver tudo isso, mas, infelizmente, sozinho ele não conseguirá. Precisará da graça, da força da oração, do poder da Palavra, da graça poderosa da reconciliação e Eucaristia.
Maria contou com a graça de Deus como ninguém. Disse seu "sim" incondicional e foi fiel. Viveu de maneira diferente de todas as pessoas de todos os séculos, enquanto durar a humanidade, pois nela refletia-se de maneira singular o próprio Deus. Ser diferente não a abalava. Era uma mulher de fé. Especialmente, era uma mulher que sabia amar, que viveu plenamente sua sexualidade feminina e a maternidade que dela decorre na pureza, na castidade, na fidelidade e obediência a Deus. Quem, de fato, crê, não tem medo de ser diferente. Pelo contrário, sem agressões e vivendo com toda a simplicidade a graça de Deus, é diferente pelo mero fato de ter-se entregue a Ele. Da mesma forma, para quem ama de verdade, ser aceito ou não pelo mundo tem muito pouca, mas muito pouca importância mesmo. Importa Aquele a quem ama e para quem vive e aqueles para quem Ele ama e vive.

Deixo você com esta reflexão de D. 'Rafael sobre o poder da graça e da virtude da castidade sobre o amor humano:

"O amor humano, que vem da natureza, e o divino, que provém da graça, entrelaçam-se e complementam-se: a graça fortifica, eleva, sublima a natureza. É um privilégio único do ser humano que a vida sexual, que deriva da natureza, esteja impregnada pelo amor de Deus que deriva da graça. Dito de maneira mais clara, a energia sexual, a libido, é banhada, é tonificada pelo amor de Deus. O amor de Deus eleva de tal modo o instinto sexual que muda profundamente a sua contextura. Assim, é possível viver de modo estável e gostoso a virtude da castidade".

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

O que é caráter?





O que é caráter? E que queremos significar quando dizemos de alguém: eis um caráter? A palavra caráter designa a vontade humana firmemente orientada para o bem; e um jovem é um caráter, se tiver princípios nobres a orientar a sua conduta, não se afastando deles, mesmo se esta constância lhe impõe sacrifícios. Aquele que, pelo contrário, muda de princípios conforme as circunstâncias, a sociedade ou os amigos, que abandona uma maneira de proceder, reconhecida até então como boa, sob pretexto de que por ela não deve sofrer o menor desgosto, - esse tal é versátil e pouco seguro, não passa de um caráter frouxo, ou, caso mais grave, é um jovem sem caráter. Isto basta já para te mostrar em que consiste a educação do caráter. Primeiramente é preciso que possuas princípios nobres; depois, por um exercício contínuo, é preciso habituar-se a agir em todas as circunstâncias segundo esses princípios. A vida moral de um homem sem princípios é assim como uma cana agitada pelo vento. Este homem procede hoje de uma maneira e amanhã de outra. A primeira necessidade é, pois, formar a força de que temos necessidade para seguir sem tropeçar o caminho que reconhecemos bom.
Repito: o teu primeiro cuidado deve ser formar em ti princípios justos. Ora, qual é o princípio justo quanto a estudos, por exemplo? "É preciso estudar com aplicação constante, porque Deus quer que eu cultive as faculdades que Ele me deu". - Qual é o princípio justo quanto aos colegas? "Devo fazer-lhes o que gostaria que me fizessem". E assim por diante... É indispensável que tenhas princípios justos em todas as coisas. A tua segunda preocupação é muito mais difícil: é seguir esses justos princípios, isto é, submeteres-te às exigências do caráter.
Um belo caráter não se recebe de presente; consegue-se por meio de labor árduo e contínuo, trabalhando para ele durante longos anos, dezenas de anos, muitas vezes. A influência do meio, as boas ou más tendências transmitidas por herança, podem produzir certa impressão no nosso caráter, mas, em última análise, o nosso caráter é obra nossa pessoal, o resultado do nosso trabalho de autoeducação. É dupla a educação que recebemos: a primeira é-nos dada pelos nossos pais e pela escola; a segunda - e é a mais importante - vem-nos dos nossos próprios esforços.
Sabes o que é a autoeducação? É a influência da nossa vontade sobre nós próprios, incitando-nos a seguir o bom caminho em qualquer circunstância, sem hesitar e com alegria.
Sabes o que é caráter? É proceder em conformidade com os nossos princípios fundamentais; - é o esforço exercido pela nossa alma na realização da nobre concepção que fizemos da vida.
Já agora podes compreender que i mais difícil nesta autoeducação não é a construção do princípio vital, mas sim o esforço que deve ser realizado, dia a dia, para proceder de harmonia com ele. "Este é o meu princípio e dele não me desviarei; ser-lhe-ei fiel, custe o que custar". Mas isto exige muitos sacrifícios e eis a razão porque há, no mundo, tão poucos homens de caráter.
"Permanecer fiel aos seus princípios", "nunca se afastar da verdade", - quem não se orgulharia destes belos pensamentos...?
Ah! se não fosse tão difícil converter estes pensamentos em ações!
Se estes admiráveis intentos não esmorecessem no nosso espírito tão facilmente sob a perniciosa influência da sociedade, dos amigos, da moda... do nosso próprio eu que não gosta de ser incomodado a cada passo!...
Ouve o que, a tal respeito, diz o poeta:
Atentai no que fazeis;
Não queirais ser cata-vento.
Bom caminho começado,
Não deixeis um só momento.
(Reinick)
Eis o que a autoeducação te ensinará.

Fonte: Primeiro capitulo do livro O Jovem de caráter. Toht, Tihamer 

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

O quarto mandamento do Decálogo: honrar pai e mãe



O quarto mandamento dirige-se expressamente aos filhos em suas relações com seus pais. Mas, refere-se também a outras relações de parentesco, educativas, trabalhistas, etc.


1. Diferença entre os três primeiros mandamentos do Decálogo e os sete seguintes 

Os três primeiros mandamentos ensinam o amor a Deus, Sumo Bem e Último Fim da pessoa criada e de todas as criaturas do universo, infinitamente digno em si mesmo de ser amado. Os sete restantes tem como objeto o bem do próximo (e o bem pessoal), que deve ser amado por amor de Deus, que é seu Criador. 

No Novo Testamento, o preceito supremo de amar a Deus e o segundo, semelhante ao primeiro, de amar ao próximo por Deus, resumem todos os mandamentos do Decálogo (cfr. Mt 22,36-40; Catecismo, 2196). 

2. Significado e extensão do quarto mandamento 

O quarto mandamento dirige-se expressamente aos filhos em suas relações com seus pais. Refere-se também às relações de parentesco com os demais membros do grupo familiar. Finalmente estende-se aos deveres dos alunos com respeito aos professores, dos subordinados com respeito a seus chefes, dos cidadãos com respeito a sua pátria, etc. Este mandamento implica e se refere também aos deveres dos pais e de todos os que exercem uma autoridade sobre outros (cfr. Catecismo, 2199). 

a) A família. O quarto mandamento refere-se em primeiro lugar às relações entre pais e filhos no seio da família. «Ao criar ao homem e à mulher, Deus instituiu a família humana e dotou-a de sua constituição fundamental» (Catecismo, 2203). «Um homem e uma mulher unidos em casamento formam com seus filhos uma família» (Catecismo, 2202). «A família cristã é uma comunhão de pessoas, reflexo e imagem da comunhão do Pai e do Filho no Espírito Santo» (Catecismo, 2205). 

b) Família e sociedade. «A família é a célula original da vida social. É a sociedade natural na qual o homem e a mulher são chamados ao dom de si no amor e no dom da vida. A autoridade, a estabilidade e a vida de relação no seio da família constituem os fundamentos da liberdade, da segurança, da fraternidade no seio da sociedade (...) A vida de família é iniciação da vida em sociedade» (Catecismo, 2207). «A família deve viver de modo que os seus membros aprendam a preocupar-se e a encarregar-se dos jovens e dos velhos, das pessoas doentes ou incapacitadas e dos pobres» (Catecismo, 2208). «O quarto mandamento ilumina as demais relações na sociedade» (Catecismo, 2212)[1]. 

A sociedade tem o grave dever de apoiar e fortalecer o casal e a família, reconhecendo sua autêntica natureza, favorecendo sua prosperidade e assegurando a moralidade pública (cfr. Catecismo, 2210)[2]. A Sagrada Família é modelo de toda família: modelo de amor e de serviço, de obediência e de autoridade, no seio da família. 

3. Deveres dos filhos com os pais 

Os filhos devem respeitar e honrar aos seus pais, tentar dar-lhes alegrias, rezar por eles e corresponder lealmente a seu sacrifício: para um bom cristão estes deveres são um dulcíssimo preceito. 

A paternidade divina é a fonte da paternidade humana (cfr. Ef 3,14); é o fundamento da honra devido aos pais (cfr. Catecismo, 2214). «O respeito pelos pais (piedade filial) é feito de gratidão àqueles que, pelo dom da vida, pelo seu amor e seu trabalho, puseram os filhos no mundo e lhes permitiram crescer em estatura, sabedoria e graça. «Honra o teu pai de todo o teu coração e não esqueças as dores da tua mãe. Lembra-te de que foram eles que te geraram. Como lhes retribuirás o que por ti fizeram?” (Sir 7,27-28)» (Catecismo, 2215). 

O respeito filial manifesta-se na docilidade e obediência. «Filhos, obedeçam em tudo a vossos pais, pois isto é agradável ao Senhor» (Col3,20). Enquanto estão sujeitos aos seus pais, os filhos devem obedecer-lhes no que disponham para seu bem e o da família. Esta obrigação cessa com a emancipação dos filhos, mas não cessa nunca o respeito que devem a seus pais (cfr. Catecismo, 2216-2217). 

«O quarto mandamento recorda aos filhos adultos suas responsabilidades para com os pais. Na medida em que possam, devem lhes prestar ajuda material e moral nos anos de velhice e durante suas doenças, e em momentos de solidão ou de abatimento» (Catecismo, 2218). 

Se os pais mandassem algo oposto à Lei de Deus, os filhos estariam obrigados a antepor a vontade de Deus aos desejos de seus pais, tendo presente que «é necessário obedecer a Deus antes que aos homens» (At5,29). Deus é mais Pai que nossos pais: dele procede toda paternidade (cfr. Ef 3,15). 

4. Deveres dos pais 

Os pais devem receber com agradecimento, como uma grande bênção e mostra de confiança, os filhos que Deus lhes envie. Além de cuidar de suas necessidades materiais, tem a grave responsabilidade de dar-lhes uma correta educação humana e cristã. Esta função educativa é de tanto peso que, onde não existir, dificilmente poderá ser suprida [3]. O direito e o dever da educação são, para os pais, primordiais e inalienáveis[4]. 

Os pais tem a responsabilidade da criação de um lar, onde se viva o amor, o perdão, o respeito, a fidelidade e o serviço desinteressado. O lar é o lugar apropriado para a educação nas virtudes. Devem ensinar com o exemplo e com a palavra— a viver uma singela, sincera e alegre vida de piedade; transmitir-lhes, inalterada e completa, a doutrina católica, e formar na luta generosa por acomodar sua conduta às exigências da lei de Deus e da vocação pessoal à santidade. «Pais, não irriteis a vossos filhos, pelo contrário, eduquem na doutrina e ensinamentos do Senhor» (Ef 6,4). Desta responsabilidade não devem desentender-se, deixando a educação de seus filhos em mãos de outras pessoas ou instituições, ainda que possam –e em ocasiões devam– contar com a ajuda de quem mereçam sua confiança (cfr. Catecismo, 2222-2226). 

Os pais devem saber corrigir, porque «que filho há a quem seu pai não corrija?» (Hb 12,7), mas tendo presente o conselho do Apóstolo: «Pais, deixai de irritar vossos filhos, para que não se tornem desanimados» (Col3,21). 

a) Os pais devem ter um grande respeito e amor à liberdade dos filhos, ensinando-lhes a usá-la bem, com responsabilidade [5]. É fundamental o exemplo de sua própria conduta; 
b) no relacionamento com os filhos devem saber unir o carinho e a fortaleza, a vigilância e a paciência. É importante que os pais se façam “amigos” de seus filhos, ganhando e assegurando sua confiança; 

c) para levar a bom termo a tarefa da educação dos filhos, antes que os meios humanos —por importantes e imprescindíveis que sejam— devem por os meios sobrenaturais. 

«Como primeiros responsáveis pela educação de seus filhos, tem o direito de escolher para eles uma escola que corresponda a suas próprias convicções. Este direito é fundamental. Assim que seja possível, os pais tem o dever de escolher as escolas que melhor lhes ajudem em sua tarefa de educadores cristãos (cfr. Concilio Vaticano II, Declar. Gravissimum educationis, 6). Os poderes públicos tem o dever de garantir este direito dos pais e de assegurar as condições reais de seu exercício» (Catecismo, 2229). 

«Os vínculos familiares, ainda que muito importantes, não são absolutos. Ao mesmo tempo em que o filho cresce para uma maturidade e autonomia humanas e espirituais, a vocação singular que vem de Deus se afirma com mais clareza e força. Os pais devem respeitar esta chamada e favorecer a resposta de seus filhos para segui-la. É preciso convencer-se de que a vocação primeira do cristão é seguir a Jesus (cfr. Mt 16,25): “O que ama a seu pai ou a sua mãe mais que a mim, não é digno de mim; o que ama a seu filho ou a sua filha mais que a mim, não é digno de mim” (Mt 10,37)» (Catecismo, 2232) [6]. A vocação divina de um filho para realizar uma peculiar missão apostólica, supõe um presente de Deus para uma família. Os pais devem aprender a respeitar o mistério da chamada, ainda que pode ser que não a entendam. Essa abertura às possibilidades que abre a transcendência e esse respeito à liberdade se fortalece na oração. Assim se evita uma excessiva proteção ou um controle indevido dos filhos: um modo possessivo de atuar que não ajuda ao crescimento humano e espiritual. 

5. Deveres com os que governam a Igreja 

Os cristãos devemos ter um «verdadeiro espírito filial em relação à Igreja» (Catecismo, 2040). Este espírito tem-se de manifestar com aqueles que governam a Igreja. 

Os fiéis «devem aceitar com prontidão e cristã obediência tudo o que os sagrados pastores, como representantes de Cristo, estabelecem na Igreja como mestres e dirigentes. E não deixem de colocar em suas orações a seus prelados, para que, já que vivem em contínua vigilância, obrigados a dar conta de nossas almas, cumpram isto com alegria e não com pesar (cfr. Hb 13,17)» [7]. 

Este espírito filial mostra-se, antes de mais nada, na fiel adesão e união com o Papa, cabeça visível da Igreja e Vigário de Cristo na terra, e com os Bispos em comunhão com a Santa Sé: 

«Teu maior amor, tua maior estima, tua mais profunda veneração, tua obediência mais rendida, teu maior afeto tem de ser também para o Vice-Cristo na terra, para o Papa. 

Devemos pensar nós católicos que, após Deus e de nossa Mãe a Virgem Santíssima, na hierarquia do amor e da autoridade, vem o Santo Padre»[8].

6. Deveres com a autoridade civil 

«O quarto mandamento de Deus ordena-nos também honrar a todos os que, para nosso bem, tem recebido de Deus uma autoridade na sociedade. Este mandamento determina tanto os deveres de quem exerce a autoridade como os de quem estão submetidos a ela» (Catecismo, 2234)[9]. Entre estes últimos encontram-se: 

a) respeitar as leis justas e cumprir os legítimos mandatos da autoridade (cfr. 1 Pe 2,13); 

b) exercitar os direitos e cumprir os deveres cidadãos; 

c) intervir responsavelmente na vida social e política. 

«A determinação do regime e a designação dos governantes devem deixar-se à livre vontade dos cidadãos»[10]. A responsabilidade pelo bem comum exige moralmente o exercício do direito ao voto (cfr. Catecismo, 2240). Não é lícito apoiar àqueles que programam uma ordem social contrária à doutrina cristã e, portanto, contrário ao bem comum e à verdadeira dignidade do homem. 

«O cidadão tem obrigação em consciência de não seguir as prescrições das autoridades civis quando estes preceitos são contrários às exigências da ordem moral, aos direitos fundamentais das pessoas ou aos ensinamentos do Evangelho. A rejeição da obediência às autoridades civis, quando suas exigências são contrárias às da reta consciência, tem sua justificativa na distinção entre o serviço de Deus e o serviço da comunidade política. “Dêem ao César o que é do César e a Deus o que é de Deus” (Mt22,21). “Há que obedecer antes a Deus que aos homens” (At 5,29)» (Catecismo, 2242). 

7. Deveres das autoridades civis 

O exercício da autoridade deve facilitar o exercício da liberdade e da responsabilidade de todos. Os governantes devem velar para que não se favoreça o interesse pessoal de alguns na contramão do bem comum [11]. 

«O poder político está obrigado a respeitar os direitos fundamentais da pessoa humana. E a administrar humanamente a justiça, respeitando os direitos da cada um, especialmente os das famílias e os dos desabrigados. Os direitos políticos inerentes à cidadania (...) não podem ser suspensos pela autoridade sem motivo legítimo e proporcionado» (Catecismo, 2237). 

Antonio Porras 


Bibliografía básica 

Catecismo da Igreja Católica, 2196-2257. 

Compêndio da doutrina social da Igreja, 209-214; 221-254; 377-383; 393-411. 

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[1] Cfr. Compêndio da doutrina social da Igreja, 209-214; 221-251. 

[2] Cfr. Ibidem, 252-254. 

[3] Cfr. Concílio Vaticano II, Declar. Gravissimum educationis, 3. 

[4] Cfr. João Paulo II, Ex. ap. Familiaris consortio, 22-11-81, 36; Catecismo, 2221 e Compêndio da doutrina social da Igreja, 239. 

[5] E, «quando chegam à idade correspondente, os filhos tem o dever e o direito de eleger sua profissão e seu estado de vida» (Catecismo, 2230). 

[6] «E, ao consolar-nos com a alegria de encontrar a Jesus —três dias de ausência!— disputando com os Mestres de Israel (Lc 2,46), ficará muito gravada em tua alma e na minha a obrigação de deixar aos de nossa casa por servir ao Pai Celestial» (São Josemaria, Santo Rosário, 5º mistério gozoso). 

[7] Concílio Vaticano II, Const. Lumen gentium, 37. 

[8] São Josemaria, Forja, 135. 

[9] Cfr. Compêndio da doutrina social da Igreja, 377-383; 393-398; 410-411.

[10] Concílio Vaticano II, Const. Gaudium et spes, 74. Cfr. Catecismo, 1901. 

[11] Cfr. João Paulo II, Enc. Centesimus annus, 1-5-1991, 25. Cfr.Catecismo, 2236.


Fonte: www.opusdei.org.br