Por Padre Francisco Faus
Em outra reflexão (“Condições da
oração: I – Recolhimento”), meditávamos sobre a necessidade de conseguirmos
condições favoráveis, externas e internas, para poder fazer uma boa oração.
Já vimos como é imprescindível o
recolhimento exterior (local e ambiente propício para orar) e o recolhimento
interior (acalmar e ordenar o barulho íntimo, a agitação dos pensamentos, os
sentimentos confusos, os medos, recordações, etc.).
Mencionávamos também, ainda que
só de passagem, uma outra condição: para orar, é preciso ter sinceridade, a
coragem de enfrentar a verdade no íntimo do coração. Vamos refletir agora um
pouco sobre isso.
É interessante verificar que o
primeiro conselho de Cristo sobre a oração que se encontra no Evangelho, fala
de sinceridade: «Quando orardes – diz Jesus -, não façais como os hipócritas»
(Mt 6,5).
Que fazem os “hipócritas”? Vamos
recordar o que Jesus nos fala deles, e – ao vermos as máscaras que Cristo lhes
tira – enxergaremos melhor a sinceridade que nos pede.
A) Primeira máscara: No meio da
parábola do semeador, nosso Senhor faz uma citação do profeta Isaías: “O
coração deste povo se endureceu: taparam seus ouvidos e fecharam os seus olhos,
para que seus olhos não vejam e seus ouvidos não ouçam, nem seu coração
compreenda; para que não se convertam e eu os sare” (Mt 13,15).
Como são claras essas palavras! O
segredo está no final da frase: não querem se “converter”, ou seja, não estão
dispostos a aceitar a graça de Deus, que os curaria dos seus erros e pecados, e
os levaria a mudar. Isso faz com que seu coração se “endureça”; e essa dureza
de coração se manifesta na má vontade, que leva a não querer ouvir nem ver
(“tapar os ouvidos e fechar os olhos”).
Que Deus nos livre dessa dureza
de coração! Mas…, será que não temos um pouco disso? Às vezes, custa-nos abrir
o coração com plena sinceridade diante de Deus, expor sem medo a nossa vida à
luz das exigências do Evangelho, dispor-nos a acolher os conselhos do de um
confessor…, simplesmente porque não queremos mudar. O coração deixou de ser
manso e flexível, e ganhou a dureza da pedra. Ora, agir assim é a mesma coisa
que expulsar Deus da alma; é como que dizer-lhe: “Não me toques, não mexas
comigo, não me perturbes, fica longe de mim!”.
Como é bela a sinceridade da alma
que, quando vai orar, abre de par em par o coração, disposta a aceitar todas as
luzes, inspirações e exigências que Deus lhe quiser manifestar. Só ora bem uma
alma aberta e transparente, uma alma corajosa, disposta a mudar.
B) Segunda máscara: a do fariseu
(Lc 18, 9-14). Sobe ao templo, e ora no seu interior desta forma: “Graças te
dou, ó Deus, que não sou como os outros homens: ladrões, injustos e adúlteros;
nem como o publicano que está ali. Jejuo duas vezes na semana e pago o dízimo
de todos os meus lucros”. É a máscara do orgulho, do convencimento, da falsa
bondade. Aparentando piedade, o fariseu, na realidade, se defende. Ele, no
fundo, diz a Deus: “Veja, Deus, eu sou bom: não tenho pecado. Não falho nas
minhas obrigações religiosas, e não me misturo com pecadores como esse coitado
aí… Portanto, estamos quites, o Senhor não tem nada a reclamar de mim, pode me
deixar em paz”.
Nunca conheceram cristãos assim?
Dizem: “Não faço pecados, não preciso me confessar; eu cumpro as minhas
obrigações; vou à Missa sempre que posso”. Com essa mentalidade, é impossível
falar com Deus e ouvi-lo. “O orgulho cega tremendamente”, dizia São Josemaria
Escrivá. Cuidado! Porque esse orgulho que nos leva a justificar-nos, vai nos
congelando, petrificando no erro, no mal, na mediocridade. Quando vê esse
coração endurecido, é natural que o Espírito Santo nos recorde o que Jesus
comentava acerca do fariseu: «Não saiu do templo – da oração -justificado». Por
que? Porque «Deus resiste aos soberbos e só dá a sua graça aos humildes» (Ver 1
Pedr 5,5).
Entende-se assim o que diz o
“Catecismo da Igreja Católica”: “O pedido de perdão é o primeiro movimento da
oração…” (n. 2631), e que ciete como exemplo a oração do publicano, ouvida por
Deus com carinho: “Tem piedade de mim, pecador” (Lc 18,13).
Terceira máscara: Essa máscara é
também Jesus quem a arranca da alma de alguns hipócritas, quando diz: «Nem todo
aquele que me diz “Senhor, Senhor!”, entrará no Reino dos céus, mas sim aquele
que faz a vontade de meu Pai que está nos céus» (Mt 7,21).
Glosando estas palavras, São
Josemaria Escrivá falava da “oração dos filhos de Deus”, que é o oposto ao
palavreado dos hipócritas, e pedia: «Que o nosso clamar – “Senhor!” – se una ao
desejo eficaz de converter em realidade essas moções interiores que o Espírito
Santo desperta na alma».
A oração do egoísta sentimental,
que gosta de rezar, que chora ao cantar na Igreja, que se emociona com um bom
sermão…, mas que não procura entender nem realizar a Vontade de Deus, é a
“oração dos hipócritas”, que têm duas vidas separadas: a vida “espiritual” e a
vida prática, real. Se Deus quiser, em outras ocasiões meditaremos sobre a
união entre a oração e o cumprimento da Vontade de Deus na vida, no dia-a-dia
Quarta máscara: É a que nos
mostra, com palavras brevíssimas, esta frase de Cristo: «Quando vos puserdes de
pé para orar, perdoai, se tiverdes algum ressentimento contra alguém, para que
também o vosso Pai que está nos céus vos perdoe os vossos pecados”.
Se o pedido de perdão – como
acabamos de lembrar – é “o primeiro movimento da oração”, com que sinceridade
pode falar com Deus aquele que pede perdão, mas não perdoa. Poucas coisas
existem que sujem tanto a alma como o ressentimento. É uma barricada entre o
Deus do amor e da misericórdia e o pecador que somos nós. É lógico que, entre
interlocutores tão díspares, não possa haver diálogo.
Fonte: http://www.padrefaus.org
Segue o primeiro texto da serie sobre oração:
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