terça-feira, 30 de outubro de 2012

É possível conhecer algo da existência de Deus?



Por: Dom Henrique Soares

Sei que o título desde artigo é instigante. Estou ainda no marco do Catecismo da Igreja (nn. 31-43), no meu propósito de apresentar aspectos do nosso credo católico durante o Ano da Fé instituído pelo Papa Bento XVI.
A Igreja é convicta – e penso que com toda razão – de que o homem, precisamente por ter sido criado por Deus e para Deus, traz no seu íntimo o chamado irrefreável a conhecer e amar o seu Criador. Se de antemão o ser humano não se fechar preconceituosamente, descobre “certas vias” para chegar a um conhecimento da existência de Deus através de argumentos convergentes e convincentes. Para isto há, fundamentalmente, dois pontos de partida: o mundo e o próprio ser humano.
Observando a natureza, o macro e o micro cosmo, a pergunta espontânea que surge é: “Donde vem tudo isto? Por que existem estas coisas e não o nada? Donde vem a harmonia das coisas, as leis da natureza que em tudo estão inscritas?” Já Santo Agostinho exclamava: “Interroga a beleza da terra, interroga a beleza do mar, interroga a beleza do ar que se dilata e se difunde, interroga a beleza do céu, interroga todas essas realidades. Todas elas te respondem: olha-nos, somos belas! Sua beleza é um hino de louvor. Essas belezas sujeitas à mudança, quem as fez senão o Belo, não sujeito à mudança?”
Também se olharmos o ser humano, essa maravilha impressionante: quanta nostalgia da verdade e da beleza em seu coração; além disso, o impressionante sentido do bem moral, com sua liberdade e a voz da sua consciência, com sua aspiração ao infinito e à felicidade. Eta, ser humano, que teima em sonhar, em querer viver, em não se satisfazer com menos que o infinito! O bicho homem transcende o mundo material: é um poço de sonho e de capacidade de imaginar, sonhar, amar... “Como semente de eternidade que leva dentro de si, irredutível à só matéria, sua alma sedenta de infinito não pode ter origem senão no Infinito”, Aquele a que chamamos “Deus”.
Assim, “o mundo e o homem atestam que não têm em si mesmos nem seu princípio primeiro nem seu fim último”, mas que provêm de um Outro, de uma Causa Primeira, eterna, suficiente, infinita, não causada por nada. Se pensarmos nisso sem preconceito, sem má vontade, certamente o coração e a inteligência chegam a intuir a existência de Alguém inteligente, bom, amável, onipotente, respeitoso de suas criaturas, de quem tudo provém, em quem tudo encontra seu sentido último e para quem tudo caminha.
Infelizmente, esse conhecimento natural e espontâneo de Deus encontra obstáculos: (1) Primeiro, Deus ultrapassa totalmente as coisas simplesmente sensíveis. Neste mundo empanturrado do tocar, do ver, do medir, do possuir, vamos embotando nossa capacidade de respirar o Eterno, de sonhar com o Infinito que escapa aos nossos sentidos exteriores. (2) Além do mais, crer na existência de Deus não é algo simplesmente teórico, mas em geral, traz consequências para a vida prática, exigindo mudança, compromisso com o bem e abandono do mal. Aí topamos com o orgulho, a soberba, o egoísmo e o comodismo do coração humano, com sua inclinação para o mal. Infelizmente, “os homens, em tais questões, facilmente procuram persuadir-se de que seja falso ou ao menos duvidoso aquilo que não desejam que seja verdadeiro”. Uma coisa é certa: ainda que se possa chegar a um conhecimento natural, racional da existência de Deus, sem a graça que abre o nosso coração e nos enche de boa vontade, na prática tal percepção é impossível! Fechados, obtusos e presunçosamente cegos, gritaremos: “Deus não existe!” E sussurraremos bem baixinho, para que nem mesmo nós escutemos: “Não existe, porque eu não quero que Ele exista!”
Ainda um dado importante: mesmo quando falamos sobre Deus, é indispensável levar em conta que nossa linguagem é totalmente inadequada para exprimi-Lo. Como falar do Infinito, Eterno, Imutável, que não pode ser comparado com nenhum outro ser? “É verdade que as criaturas, todas elas trazem em si certa semelhança com Deus, muito particularmente o homem, criado à Sua imagem e semelhança”. Mas, atenção: “Deus transcende toda criatura”, de modo que “entre o Criador e a criatura não se pode notar uma semelhança, sem que se deva notar entre eles uma ainda maior dessemelhança”. Assim, falando com mais exatidão, “não podemos apreender de Deus o que Ele é, mas apenas o que Ele não é e de que maneira os outros seres se situam em relação a Ele”. Trocando em miúdos: a nossa linguagem sobre Deus é verdadeira, mas sumamente inadequada: tudo quanto Dele dissermos é uma comparação mal comparada, pois Ele é o que dizemos, mas de um modo absolutamente único e diverso, já que Ele é totalmente diferente de todas as Suas criaturas. Isto coloca nossa barba de molho para que sejamos humildes ao falar de Deus e ao querer compreender os Seus caminhos! Na Bíblia, tal grandeza do Senhor Deus tem um nome: santidade! Ele é o Santo, isto é, Ele é o Outro, diverso e acima de tudo! A melhor linguagem para falar de Deus? Ei-la: o silêncio admirado e adorante!

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