sexta-feira, 19 de julho de 2013

Arte e vida espiritual



Por Pe. Jonathan Loop
Traduzido por Andrea Patrícia

No Antigo Testamento, Deus Onipotente dirigiu Salomão, o filho de Davi, a construir em Sua honra um glorioso templo que serviria como Sua casa entre a nação judia. Quando essa casa de Deus ficou completa após sete anos de construção, foi-nos dito: “Uma nuvem encheu a casa do Senhor, e os sacerdotes não podiam ministrar por causa da nuvem; pois a glória do Senhor enchia a casa do Senhor.”1 Por esta razão o Salmista exclama: “A santidade é vossa casa, Senhor, na duração dos séculos.”2 entretanto, esse templo terrestre foi feito apenas para servir como uma imagem do lugar de habitação do bom Deus no Novo Testamento.

O Templo de Deus é Sagrado

Na primeira de suas cartas aos cristãos de Corinto, São Paulo escreve: “Vocês não sabem que são o templo de Deus e que o Espírito de Deus habita em vocês? Pois o templo de Deus é sagrado, o que vocês são” 3. A essa luz, nós podemos entender melhor as palavras de Nosso Senhor a mulher samaritana que disse que os judeus louvavam a Deus em Jerusalém, enquanto que os samaritanos louvavam a Deus no Monte Garizim. Ele disse a ela: “Vem a hora em que não adorareis o Pai nem nessa montanha nem em Jerusalém. Vem a hora e agora é quando os verdadeiros adoradores irão adorar o Pai em espírito e em verdade. Deus é espírito, e aqueles que O adoram devem adorá-lO em espírito e em verdade”4 Em outras palavras, onde quer que haja uma alma cristã em estado de graça, aí então encontraremos um templo onde verdadeira adoração pode ser rendida a Deus Onipotente.

Vamos tomar, então, alguns momentos para ver o quanto nós estamos aptos a tornar nossas almas dignas moradas do Criador do Céu e da terra. Para fazer isso, deixe-nos considerar brevemente algumas das qualidades que caracterizam as lindas catedrais - Chartres, Notre Dame de Paris, Basílica de São Pedro em Roma, para nomear algumas – que foram construídas durante a Era da Fé. Essas igrejas foram projetadas principalmente com o fim de honrar e glorificar o bom Deus; tudo nelas era direcionado a esse propósito. Embora muitos estilos diferentes tenham dominado vários períodos da arquitetura das igrejas, há vários elementos que permanecem constantes através dos séculos. Entre esses, nós devemos focalizar na grande ordem encontrada nas igrejas católicas, a frequente presença da luz natural, e o fato de que essas construções foram tradicionalmente feitas de pedra.

O Altar é o Centro

Quando alguém entra numa catedral católica, não pode deixar de se impressionar pela grandiosidade do edifício bem como pela harmoniosa arrumação de tudo contido nela.5 Esses dois elementos contribuem para o senso de ordem que permeia os templos de nossa religião. É claro, se nós falamos de ordem, nós necessariamente indicamos algo que tanto estabelece quanto define essa ordem. Nas catedrais católicas – e, de fato, até mesmo na mais humilde paróquia católica – esse princípio da ordem não é nenhum outro senão o altar. Em um sermão, o Arcebispo Lefebvre perguntou retoricamente: “O altar é o centro de todas as nossas basílicas e nossas igrejas ou não é?” Ele continua e diz: “O que os missionários fazem nas terras em que eles querem evangelizar? A primeira coisa que eles fazem é montar uma capela, um lugar de oração. E nesse lugar, o que eles colocam no meio? Um altar.”6 Todo o desenho das igrejas católicas é feito para direcionar as almas para o altar. Por quê? Porque lá é oferecido o santo Sacrifício da Missa, que é o sacrifício da Cruz renovado de uma maneira incruenta, e lá é ofertado a Deus o mais perfeito ato de oração e adoração possível. A belíssima arte – estatuário, vitrais, vestimentas e ornamentos— bem como a nobreza das proporções majestosas de nossas catedrais são feitas simplesmente para ajudar nossas mentes a compreender mais perfeitamente a sublime realidade que é estabelecida nessas pedras sagradas.

Assim como é nas nossas catedrais e igrejas, deve ser em nossas almas. Cada faculdade, cada desejo, cada propriedade das nossas almas deve ser direcionada a reproduzir dentro de nós o sacrifício que Nosso Senhor ofereceu no Calvário, e continua a oferecer em nossos altares. O que isso significa para nós na prática? Para responder a isso, nós devemos primeiro perguntar o que repousa no coração do sacrifício de Nosso Senhor. Nós devemos verdadeiramente dizer que o sacrifício que Nosso Senhor ofereceu no Calvário – e que Ele continua a oferecer sobre os nossos altares – foi essencialmente de obediência a vontade de Seu Pai: “Ele humilhou a Si mesmo, sendo obediente até a morte, e morte de Cruz”7. Nós podemos ver a oblação final que nosso Senhor fez no jardim do Getsêmani: “Pai, se possível, afastai de Mim esse cálice. Todavia, que não seja feita a Minha vontade, mas a Vossa”8. O Calvário, entretanto, foi simplesmente, a expressão final de toda a vida de Cristo. São Paulo ensina que quando Nosso Senhor entrou em nosso mundo, o primeiro movimento de Sua alma foi para exclamar: “Sacrifício e oblação Vós não quisestes, mas formaste um corpo para Mim. Então disse Eu: ‘Eis que venho; no livro está escrito de Mim que Eu deveria fazer a Vossa vontade.”9 Durante Sua vida pública, Ele nunca deixou de repetir: “O Meu alimento é fazer a vontade Dele que me enviou.”10 Nossa maior paixão deve ser buscar e cumprir a vontade de nosso Pai no céu. Isso invariavelmente irá significar sacrificar aquilo que é mais caro a nós – nossa própria vontade – sobre o altar de nossos corações. Tudo o que há em nós — nossa mente, memória, emoções, dons físicos — e até mesmo nossas posses exteriores devem ser ordenadas a este altar espiritual e ao sacrifício espiritual que é oferecido sobre ele.

Atenção a Nosso Senhor

Outro aspecto da arquitetura das igrejas nos revela características adicionais do simbolismo inerente nos templos cristãos. Tradicionalmente, igrejas católicas foram construídas de frente para o leste para ficar na direção do sol nascente. Assim, quando é rezada a Missa, a luz do novo dia pode ser derramada dentro da igreja. Embora isso evidentemente sirva a um propósito prático, também atrai a nossa atenção a Nosso Senhor, que é a “luz do mundo.” No Evangelho segundo São João, é relatado que falou sobre esse assunto em inúmeras ocasiões. Por exemplo, imediatamente antes de Sua Paixão, Ele explicou: “Eu venho como uma luz ao mundo; aquele que crê em Mim, não permanecerá nas trevas”11 Ao orientar as igrejas que eles construíram, nossos antepassados quiseram dessa maneira destacar o fato de que a Santa Madre Igreja é iluminada pelo Sol da Justiça.

Aqui novamente nós podemos extrair uma valiosa lição para as nossas vidas espirituais. Nós também precisamos projetar nosso edifício spiritual de maneira tal que permita que Nosso Senhor lance Sua luz abundantemente dentro de nossas almas. No prólogo do Evangelho de São João, nós lemos: “Nele estava a vida, e a vida era a luz dos homens.”12 O que isso significa? Nós devemos estudar a nossa Fé. O que é a nossa Fé senão as verdades que Nosso Senhor nos ensinou? Quais são as verdades que Nosso Senhor nos revelou senão as luzes sobrenaturais muito mais brilhantes do que o mais brilhante conhecimento natural dos maiores filósofos? O Arcebispo Lefebvre costumava dizer que uma criança de cinco anos de idade que conhece o seu catecismo entende a realidade melhor do que os mais renomados eruditos [que não conhecem o catecismo]. Quanto mais absorvemos os ensinamentos do Deus Encarnado, mais Ele deverá dissipar de nós a escuridão da nossa ignorância e erro. Ele disse: “Eu Sou a luz do mundo: aquele que segue a Mim, não andará nas trevas, mas terá a luz da vida.”13

O Próprio Cristo é a Pedra Angular

Finalmente, é digno de nota que o material de construção escolhido para as gloriosas igrejas da Cristandade foi invariavelmente pedra. Além de ser uma substância forte e nobre, tem o feliz emblema que nos lembra do fato de que “O próprio Jesus Cristo [é] a pedra angular” da Igreja. Ele é também a sólida fundação da Igreja: “Nenhuma outra fundação pode ser posta, a não ser a que já foi posta; que é Jesus Cristo.”14 Assim como é com a Igreja, é também em nossas vidas interiores. Se nós quisermos ter uma piedade sólida e equilibrada, nós devemos basea-la inteiramente em Nosso Senhor Jesus Cristo como Ele se fez conhecido a nós através da revelação pública que Ele legou à Igreja. De fato, não há necessidade de multiplicidade de devoções privadas ou práticas piedosas com o fim de agradar a Deus. Nós só temos que nos aproximar de Jesus e repousar Nele. É somente desta maneira que nossas vidas espirituais terão a estabilidade necessária que nos possibilitará evitar ser excessivamente entusiasmados por consolos espirituais ou abatidos pela desolação e pelas provações.
Nossas vidas espirituais irão conter tanto os altos quanto os baixos. O glorioso templo dedicado por Salomão seria despojado de seus tesouros dentro de poucos anos15 e finalmente destruído quando o reino de Judá foi levado ao cativeiro babilônico. Mais tarde, ele tanto retomaria a Sua morada no segundo templo construído sob a supervisão de Neemias quanto manteria Sua presença ali até à morte de Nosso Senhor Jesus Cristo.16 Deus permitirá que o templo espiritual de nossas almas sofra um destino semelhante na medida em que Ele permita — devemos fielmente nos esforçarmos para servi-lO — que sejamos despojados das riquezas da sua consolações. Podemos até mesmo ir tão longe como dizer que Ele vai permitir que ele seja destruído na medida em que Ele trabalha para aniquilar qualquer coisa nele que seja indigna de Si mesmo. Apenas na medida em que nós tenhamos colocado Cristo como o fundamento do nosso edifício espiritual, assegurado que a Sua luz banha seu interior, e colocado no seu centro o altar sobre o qual está sendo sacrificada a nossa vontade, seremos capazes de suportar o trabalho construtivo de Deus em nossas almas. Então Nosso Senhor e Seu Pai Eterno virão de bom grado tomar posse eterna de nossas almas e enchê-las com a Sua glória.


O autor:

Pe. Jonathan Loop nasceu e foi criado como episcopaliano. Ele frequentou a faculdade na Universidade de Dallas, onde recebeu a graça de se converter, por intermédio de vários de seus colegas, alguns dos quais mais tarde se tornariam religiosos com os Dominicanos de Fanjeaux. Após graduar-se com grau de bacharel em Filosofia Política, ele se matriculou no Seminário Santo Tomás de Aquino, onde foi ordenado sacerdote em junho de 2011. 

Notas: 

1 I Reis 8,10-11.

2 Salmo 92,5.

3 I Cor. 6,19.

4 Jn. 4,21-4.

5 Na primeira visita do autor a Europa ele visitou a Espanha. Junto com um amigo Mórmon, ele entrou na catedral de Sevilha e foi subjugado pela imensidão e majestade da construção. Como ambos tiveram que erguer suas cabeças para assimilar toda a extensão do interior e vislumbrar o teto, os normalmente loquazes adolescentes foram reduzidos à expressão de monossilábica admiração.

6 Sermão de 27 de Março, 1975.

7 Fil. 2,8.

8 Lc. 22,42.

9 Heb. 10,5, 7.

10 Jn. 4,34.

11 Jn. 12,46.

12 Jn. 1,4.

13 Jn. 8,12.

14 I Cor. 3,11.

15 I Reis 14,25. O templo foi saqueado cerca de 30 anos depois de ter sido concluído.

16 Lc. 23,45.

Fonte: http://borboletasaoluar.blogspot.com.br

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